Opinião: O São João de Caruaru é ‘Gigante pela própria natureza’. por Paulo Nailson

Opinião: O São João de Caruaru é ‘Gigante pela própria natureza’. por Paulo Nailson

27 de junho de 2023 Off Por blogem

Caminhamos para o encerramento do São João em Caruaru, ainda no clima de retomada após o período pandêmico, incorporando Segurança e Sustentabilidade entre as prioridades. Diversidade, Mobilidade e Inclusão também foram observados. Para cada gosto e preferência um ambiente adequado. Algumas questões sempre estiveram presentes e creio que vão continuar, entre elas o fato de estarmos nos distanciando das origens e perdendo aos poucos a identidade com os costumes e tradições do período junino.

Neste ponto o público fica dividido entre pós e contras à contratações de artistas que não representam nossas raízes do forró, xaxado, baião e outras manifestações típicas da época. O Pêndulo já foi de um extremo à outro.
Em 2009 os gestores priorizaram radicalmente a preservação da tradição e certos valores. Na época, José Queiroz prefeito manteve a cidade cenográfica (antiga Estação Ferroviária) como Arraial Vitalino, por ser o centenário dele, e denominada de “Cidade São João do Carneirinho” com vários outros polos nesta mesma linha de preservação da cultura popular. Tivemos a polêmica em torno da recomendação às bandas que cuidassem em NÃO manter o show no Pátio de Eventos um repertório com músicas que incitassem violência e promovesse o desrespeito, coreografia com gestos obscenos e performance pornográfica, etc. Essas eram impedidas de serem executadas.
Houve uma mensagem veiculada na mídia: “A organização do evento barrou este ano as bandas de forró estilizado que se utilizam de músicas com duplo sentido pejorativo e fazem apresentações coreográficas consideradas obscenas. O objetivo é de valorizar as famílias que prestigiam os festejos e que se sentem desrespeitadas com a apresentação das bandas estilizadas”.
Lembrando o Suassuna, naquela famosa lista citada por ele: “Calcinha no chão (Caviar com Rapadura), Zé Priquito (Duquinha), Fiel à putaria (Felipão Forró Moral), Chefe do Puteiro (Aviões do forró), Chico Rola (Bonde do Forró), Banho de língua (Solteirões do Forró), Sou viciado em putaria (Ferro na Boneca), Abre as pernas e dê uma sentadinha (Gaviões do forró), … isso tudo ficou fora, mas trouxe consequências no aspecto comercial, afastando patrocínios e recebendo críticas do público desses outros estilos.
Uma forte quebra de braço com outros interesses em jogo, e a pressão econômica e de outras instâncias ao longo dos anos posteriores saiu vencendo.
A chamada descentralização, com polos na zona rural, colocada em prática pela gestão Raquel Lyra (2017) quando ainda era prefeita, foi caminhando para a busca pelo equilíbrio. E o investimento feito por Rodrigo Pinheiro no São João na Roça deixando o mês específico e dando estrutura mais digna (palco, segurança e organização geral) e reconhecidamente aprovado por todos. As Comidas Gigantes cooperam para levar as festividades para os bairros e tantos outros acontecimentos, como as exposições em museus ou itinerantes, espetáculos circenses, mamulengos, encontros literários, etc.
O ano de 2023 teve sim mudanças estruturais e organizacionais marcantes. O nosso São João de fato é Multicultural. Para além de tudo que já existia, inclusive no Polo Azulão, teve a estreia do Palco Instrumental Rildo Hora. A preservação da tradição da cultura popular foi mantida em muitos polos, inclusive no Pátio de Eventos, ainda que haja ajustes necessários e possíveis de serem considerados. Tivemos todos os dias os Brincantes dos Bois, Bacamarteiros, Mazuca, Declamadores, Sanfoneiros, Violeiros, Povos de Matriz Africana e Indígenas, artes cênicas com nossos artistas do Teatro, dançarinos, exposições de Artes Plásticas, Expressões Religiosas, englobando todos os segmentos culturais da cadeia produtiva artística. A grandeza da festa foi alinhada ao interesse comercial com a necessidade de preservação cultural. Mas repito: é necessário olhar atento, vigilante e humildade para corrigir onde houve falhas e equívocos, para que o processo de aperfeiçoamento continue acontecendo.
O passado já deixou sua marca no devido tempo. O presente é o que temos agora e por isso devemos compreender as transformações pelas quais a cultura de um povo vai passando no decorrer das décadas, não fazendo apologia ao isolamento cultural, nem se fechando em guetos. O CMPC (Conselho Municipal de Política Cultural) precisa ter seu espaço físico garantido com stand no Centro Integrado de Monitoramento e Gestão de Eventos, ou na Cidade Cenográfica, para atuar dentro de suas atribuições.
Enfim, estejamos abertos ao novo, mas com o devido cuidado de buscar o caminho sempre do diálogo e das convergências em meio a tantas diversidades.

Paulo Nailson é assessor parlamentar e editor do BPN

Foto: Elvis Édson.